16.6.16

quatro pontos, um em cada lado de qual quadrado?


Hoje vamos tratar de um outro tipo de problema de construção de quadrados, que nos tem aparecido repetidamente, a saber:
a construção de um quadrado do qual cada uma das retas dos seus lados passa por um só de quatro pontos $\;A, \;B, \;C, \;D\;$ dados..
Para resolver este problema, é necessário olhar para as propriedades do quadrado. Tomem-se
  • quatro retas
    • $\;p, \;q, \;r,\; s, \;$ sendo
      • $\;p \perp q, \;q\perp r, \;r\perp s, \;s\perp p,\;$
      • $p \parallel r, \; q \parallel s\;$
      • e igualmente distanciadas $\;p\;$ de $\;r\;$ e $\,q\;$ de $\;s\;$
    • e os quatro pontos
      • $P,\; Q,\;R, \;S, \,$
        • respetivamente $\;p.q, \;q.r, \; r.s,\;s.t,\;$
        • sendo, obviamente iguais os segmentos $\;PQ, \;QR, \;RS, \; SP.\;$ das retas $\;p, \;q, \;r,\; s, \;$ respetivamente.
    Sabemos que
    • se uma reta corta duas retas fazendo ângulos alternos internos iguais, cf (I.27), então estas retas são paralelas;
    • qualquer segmento com extremidades em duas retas paralelas, cf (I.29), fazem com elas ângulos alternos internos iguais;
    • segmentos de reta unindo extremidades de segmentos iguais e paralelos, cf (I.33), são iguais e paralelos;
    • E, em consequência, se cortarmos dois pares de retas paralelas igualmente distanciadas, por dois segmentos a fazer ângulos alternos internos iguais (cada um a cada um), esses segmentos são iguais.
    No caso do nosso problema não nos são dados mais que um ponto $\;A\;$ em $\;p, \;$ $\;B\;$ em $\;q, \;$ $\;C\;$ em $\;r\;$ e $\;D\;$ em $\;s.\;$
    Se tomarmos $\;AC\;$ a ligar pontos das paralelas $\;p\;$ e $\;r\;$ e o ponto $\;B\;$ de $\;q,\;$ qual deve ser a relação de um reta tirada por $\;B\;$ com $\;q, \;s,\; AC\;$ para intersectar $\;s\;$ de modo a ter os mesmos ângulos alternos internos ao cortar $\;q, \; s\;$ em ângulos iguais aos feitos por $\;AC\;$ ao cortar $\;p, \;r$?
    Bastará tirar por $\;B\;$ a perpendicular a $\;AC\;$ porque, designando por $\;I\;$ a intersecção das perpendiculares, $\; A\hat{P}B= B\hat{I}A = 1 reto, \;$ e, em consequência, $\;P\hat{B}I + A\hat{I}B = 2 retos,\;$ bem como $\;Q\hat{A}I + A\hat{I}B = 2 retos,\;$ ou seja, $\;Q\hat{A}I = P\hat{B}I.\;$
    De modo inteiramente análogo, se provaria que cada um dos ângulos feitos entre $\;AC, \;r\;$ era igual a um dos ângulos feitos pela perpendicular a $\;AC\;$ tirada por $\;B\,$ com $\;s\;$.

    Se $\;BD\;$ não for perpendicular a $\;AC,\;$, na perpendicular a $\;AC\;$ tirada por $\;B\;$ encontramos um segundo ponto $\;E\;$ de $\;s\;$ de que nos tinha sido dado $\;D.\;$ Este ponto $\;E\;$ é tal que $\;BE\perp AC\;$ e $\;BE =AC, \;$ por estes serem segmentos com extremidades em pares de retas igualmente distanciadas e paralelas, por fazerem com elas iguais ângulos alternos internos: $\;s=DE\;$
    Isto chega para resolver o nosso problema de construção.

    $\fbox{n=0}\;\;\;$ Não conhecemos mais que os pontos $\;A, \;B, \;C, \;D\;$ dados.


    © geometrias.16 junho 2016, Criado com GeoGebra


    Peguemos na régua e no compasso.
    $\fbox{n=1}$ Tira-se por $\;B\;$ a perpendicular a $\;AC \;$ que, intersectada pela circunferência de centro $\;B\;$ e raio $\;AC\;$ determina um ponto $\;E\;$ da reta $\;s\;$ que contém o lado oposto ao lado $\;q\;$ que passa por $\;B.\;\;\;\; DE=s$
    $\fbox{n=2}$ Determinada a reta $\;s\;$ pode tirar por $\;A\;$ a perpendicular $\;p\;$ a ela e tomar a intersecção $\;p.s : \;\;\;S, \;$ vértice do quadrado.
    Do mesmo modo, a perpendicular a $\;s\;$ tirada por $\;C\;$ que designamos por $\;r\;$, sendo o vértice $\;R\;$ determinado por $\;r.s\;$
    $\fbox{n=3}$ Finalmente a perpendicular a $\;p\;$ (ou a $\;r\;$) tirada por $\;B\;$ que designamos por $\;q\;$ e que é a reta que faltava para a determinação por $\;p.q\;$ de $\;P\;$ e por $\;q.r\;$ de $\;Q.$
    $\fbox{n=4}$ Apresenta-se o quadrado $\;PQRS\;$ em que $\;A\in p, \; B\in q, \; C \in r, \; D \in s\;$

    Este problema tem muitas soluções, claro.

    1. EUCLID’S ELEMENTS OF GEOMETRY The Greek text of J.L. Heiberg (1883–1885) from Euclidis Elementa, edidit et Latine interpretatus est I.L. Heiberg, in aedibus B.G. Teubneri, 1883–1885 edited, and provided with a modern English translation, by Richard Fitzpatrick
    2. David Joyce. Euclide's Elements
    3. George E. Martin. Geometric Constructions Springer. New York; 1997
    4. Robin Hartshorne. Geometry: Euclid and beyond Springer. New York: 2002
    5. Howard Eves. Fundamentals of Modern Elementary Geometry Jones and Bartlett Publishers, Boston: 1991.

13.6.16

Quadratura de um par de hexágonos regulares




Temos vindo a apresentar construções de régua e compasso para determinar um quadrado de área igual à área de uma dada figura. Em todas elas, há uma preocupação de economia no que ao número de passos respeita. O número de passos de uma construção refere-se ao número de vezes que se recorre à régua ou ao compasso. A identificação de pontos como intersecção de retas com retas, de retas com circunferências, e de circunferências com circunferências não contam como passos da construção. Um dos problemas que nos é apresentado em [3] pede
a construção de um quadrado de área igual à soma das áreas de dois dados hexágonos regulares, com o menor número de passos.
O problema é interessante porque nos pede que estudemos o hexágono e a forma de pensar em determinar uma figura de área igual à soma das áreas de dois hexágonos antes de pensarmos na quadratura propriamente para evitarmos alguns passos da construção. Há vários outros caminhos que podem ser seguidos para resolver o problema. Sabemos determinar os dois quadrados cada um equivalente a um dos hexágonos e obtidos estes, sabemos obter o quadrado somma das áreas, recorrendo ao teorema de Pitágoras e ete seria o caminho óbvio a seguir.
$\fbox{n=0}\;\;\;$ A figura dinâmica abaixo apresenta-nos um hexágono regular $\;ABCDEF\;$ inscrito numa circunferência de centro $\;O\,$ que sabemos ter raio igual ao lado do hexágono regular que aqui designamos por $\;a= AB=BC=CD=DE=EF=FA.\;$
Podem ver-se ainda os diâmetros $\;AD, \;BE, \;CF\;$ que dividem o hexágono em três paralelogramos equiláteros iguais $\;OABC,\;OCDE, \;OEFA, \;$ ou em seis triângulos equiláteros iguais $\;OAB, $ $\;OBC, \;OCD, \;ODE, \;OEF, \;OFA\;$ e de lados iguais ao lado do hexágono ou ao raio da circunferência em que o hexágono se inscreve.

© geometrias.13 junho 2016, Criado com GeoGebra


$\fbox{n=1}$ Tomámos o segmento $\;BB_0\;$ sendo $\;B_0\;$ o ponto médio de $\;OA. \;$ O retângulo de dimensões $\;BB_0 \times OB_0\;$ tem área igual ao triângulo $\;OAB.\;$
Sabemos que $\;OB_0 = \displaystyle \frac{a}{ 2}\;$ e que o quadrado de lado $\;OB=a\;$ é igual à soma dos quadrados de lados $\;OB_0 = \displaystyle \frac{a}{ 2}\;$ e $\;BB_0:\;$ $\;OB^2 =OB_0^2+BB_0^2. \;$
E, por isso podemos dizer que o quadrado de lado $\;BB_0\;$ tem área igual à da figura que se obtém retirando ao quadrado de lado $\;OB = a\;$ o quadrado de lado $\;OB_0:\; \; \; BB_0^2 = a^2 - (\displaystyle \frac{a}{2})^2 = \displaystyle \frac{3}{4} \times a^2, \;$ ou seja, o quadrado de lado $\;BB_0\;$ é, em área, três quartas partes do quadrado de lado $\,a.\;$
A área do retângulo (de diagonal $\;OB\;$) é $\;BB_0 \times OB_0 = k.a \times \frac{a}{2} = \frac{k}{2} a^2, \;$ em que $\;k\;$ é tal que $k^2=\frac{3}{4}.\;$
A área deste retângulo, igual à área do triângulo $\;OAB,\;$ é dada pela parte $\;\displaystyle \frac{k}{2} \;$ do quadrado de lado $\;a\;$ e, em consequência, a área do hexágono regular de lado $\;a\;$ é $\;3k\times a^2.\;$
$\fbox{n=2}$ Como sabemos todos os hexágonos regulares são semelhantes e podemos representar as diferentes classes de hexágonos regulares iguais entre si, por algum hexágono inscrito numa circunferência centrada em $ \;O\;$ que é o centro de um primeiro hexágono regular de lado $\,a\;$ e área $3k\times a^2. \;$ Para representar a classe de hexágonos regulares com um dado lado $\;b\;$ escolhemos o hexágono regular $\;GHIJKL\;$ também centrado em $\;O\;$ e do qual sabemos a área que é $\; 3k.b^2\;$
E também sabemos que se houver um hexágono regular cuja área seja igual à soma das áreas dos hexágonos de lados $\;a\;$ e $\;b :\;\;\; 3k. a^2 + 3k.b^2 \;$ terá de ter um lado $\;c:\;´\;\; 3k.c^2 = 3k.a^2+ 3k.b^2$, ou seja tal que $\; c^2 =a^2 + b^2.\;$
$\fbox{n=3}$ Pelo que vimos, o lado do hexágono regular de lado $\;c\;$ é tal que $\;c^2= a^2+b^2\;$ ou seja é a hipotenusa deum triângulo retângulo de catetos $\;a, \;b.\;$ que desenhámos tirando por $\;G\,$ uma perpendicular a $\;OG\;$ e tomando sobre essa perpendicular $\;M\,$ tal que $\;GM =a.\;$
$\fbox{n=4}$ Qualquer dos hexágonos regulares inscritos na circunferência de centro $\;O\;$ e raio $\;OM\;$ tem área igual à soma das áreas dos hexágonos $\;ABCDEF\;$ e $\;GHIJKL,\;$ já que $\;c^2 = a^2+b^2 \Leftrightarrow 3k.c^2 = 3k.a^2 + 3k. b^2.\;$ O hexágono $\;PQRSTU\;$ está nessas condições.
$\fbox{n=5}$ Isolemos o hexágono regular $\;GHIJKL.\;$ O nosso problema de quadratura de um par de hexágonos regulares dados fica reduzido à quadratura deste hexágono $\;GHIJKL.\;$
$\fbox{n=6}$ Fácil é ver que um retângulo como $\;QSNV\;$ é igual em área ao hexágono $\;PQRSTU\;$. E também já sabemos determinar um quadrado de área igual a um retângulo. Assim: Toma-se um segmento, por exemplo $\;QW\;$ igual à soma das dimensões do retângulo $\;QV+VN\;$ e uma semicircunferência de diâmetro $\;QW.\;$ Qualquer ponto dessa semicircunferência é vértice de um ângulo reto de lados a passar pelos extremos do diâmetro $\;Q, \;W. \;$ Se tomarmos $\;Z\;$ na semicircunferência e na perpendicular a $\;QW\;$ tirada por $\;V\;$, os triângulos retângulos em $\;V,\;$ $\;ZQV\;$ e $\;VWZ, \;$ e $$ \frac{QV}{VZ} = \frac{VZ}{VW}$$ ou, por ser $\;VW=VN,\;$ podemos afirmar que a área do retângulo $\;VQSN\;$ é igual à área do quadrado de lado $\, VZ:\;$ $$ QV \times VN = VZ^2$$
$\fbox{n=7}$ Encontrámos assim o quadrado de área igual à soma das áreas de 2 hexágonos regulares dados: $\;VXYZ\;\;\;\;$


  1. EUCLID’S ELEMENTS OF GEOMETRY The Greek text of J.L. Heiberg (1883–1885) from Euclidis Elementa, edidit et Latine interpretatus est I.L. Heiberg, in aedibus B.G. Teubneri, 1883–1885 edited, and provided with a modern English translation, by Richard Fitzpatrick
  2. David Joyce. Euclide's Elements
  3. George E. Martin. Geometric Constructions Springer. New York; 1997
  4. Robin Hartshorne. Geometry: Euclid and beyond Springer. New York: 2002
  5. Howard Eves. Fundamentals of Modern Elementary Geometry Jones and Bartlett Publishers, Boston: 1991.